domingo, 27 de março de 2011

O menino e a semente

Numa estrada vazia rodeada de silêncio um som ritmado mostrava a vagareza dos passos de um menino de rosto cansado e olhar distante. Seguia vendo o chão e fazendo de conta que brincava com as pedras que chutava e que iam fazendo rastros pela areia... as vezes uns lagartos entravam rapidamente no meio das pequenas moitas a beira do caminho e se escondiam... nem fazia diferença se estivessem brincando de esconder ou não, o menino não teria notado. Pois em seu interior os pés não pisavam aquele chão, não havia lagarto e nem pequenas moitas à beira do caminho; apenas seus pensamentos...

E pensava... em seu coração não havia silêncio, nem dava pra ouvir o som ritmado dos seus

passos raspando sobre a areia... fazia muito barulho que era agressivo, deprimente. Era também um deserto.

La dentro estava cercado por morros gigantes de areias escorregadias e movediças... cada passo era sem esperança de chegar a algum lugar... como se as areias conversassem tentando desanimar seus pés, fazendo gritos de ódio por serem pisadas e não medindo palavras para mostrar o quanto aqueles pés eram indignos.

Havia pássaros estranhos rodeando seu corpo e olhando com desprezo suas atitudes e com atenção a todos os seus movimentos, como se estivessem esperando que caísse, pois talvez pudessem devorá-lo; pequenas arvores e cactos faziam questão de fazê-lo sentir um estranho naquele lugar.

Mas... de repente, do céu caiu uma semente fazendo um grande estrondo perto dos seus pés cansados, espirrando, como uma pedra jogada na água, areia por toda parte. Um susto tomou todo lugar! Um espantoso silêncio se fez. As areias se calaram, os olhares dos pássaros, dos cactos e das pequenas árvores se voltaram para a grande e brilhante semente. Brilhava tanto que, em pouco tempo, ninguém conseguia olhar para ela, apenas o menino! E ele olhava pasmo. E quanto mais olhava, mais brilhava.

De repente a areia começou a fugir, os pássaros ainda tentavam raivosamente atacar a semente e tirá-la daquele lugar, mas logo desistiram e saíram desesperados; os cactos e as pequenas árvores murchavam e todos iam desaparecendo juntamente com seus gritos de fúria. O deserto se desfazendo e um cenário vazio foi se formando. Os pés do menino faziam companhia para a semente que agora esta em terra. Era uma terra boa. O menino ficou tão agradecido por aquela semente ter caído salvando seus ouvidos do barulho que lhe desanimavam das areias que sempre reclamando, dos olhares que o cercava e reprimia.

Ele desejou ter aquela semente para sempre. Olhou em volta, tudo vazio, limpo e silencioso... sua alma apreciava aquele momento e transbordava de alegria. As lágrimas não cabiam dentro do seu corpo e escorriam rosto afora... até que uma primeira gota caiu sobre o chão perto da semente.

Bem lentamente raízes foram formando e aos poucos entrando na terra a medida que as lágrimas caíam... O menino viu e ainda mais queria chorar... mas as lágrimas foram se acabando e ele se ajoelhava com muita esperança, até que brotasse... e começou a chover.

Gota após gota... enchia aos poucos e umedecia a terra encharcando o sorriso de esplêndida alegria do pequeno garoto. Aos poucos a semente foi desaparecendo na terra enquanto o garoto se deliciava com a chuva. "Benção" gritava para as gotas que caiam sobre suas mãos estendidas, e repetia...

Tropeçou num galho seco e saiu engatinhando até que parou de joelhos segurando o corpo, que ia pra frente com toda a força, com as palmas das mãos. Levantou assustado, limpando a areia do corpo. Olhou para os lados... deu de frente com um senhor segurando um par de chinelos.

- deixou isso para trás, garoto.

Ainda confuso ainda voltando de um longo pensamento...

- Tenho algo pra você. – disse aquele senhor - Tome, calce essas sandálias. Ande mais rápido para anunciar a boa notícia de paz.

Logo após essas palavras aquele senhor se virou e foi embora. O menino queria segui-lo mas ele gritou "Siga os passos do Mestre!"

O garoto um pouco confuso, pensou... sorriu, olhou firmemente para o chão e viu grandes pegadas que brilhavam como a semente que caiu na terra do seu coração. "Semente!", exclamou. E rapidamente colocou a mão sobre o coração e o sentiu bater com força.

Ele sorriu novamente com mais entusiasmo... compreendeu as seguiu. E a cada passo que dava sobre as brilhantes pegadas, dentro do seu coração aquela semente germinava. Pequenas folhinhas bem verdes abriam e empurravam com coragem o solo, apreciando os primeiros suspiros à luz do sol...


...e um jardim começou a se formar preenchendo todo o espaço vazio do coração do menino.

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